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Ricardo Divila: a despedida de um gênio e seu legado para a Fórmula Vee

Ricardo Divila: a despedida de um gênio e seu legado para a Fórmula Vee

Engenheiro e projetista, Divila se transformou num dos maiores nomes do
automobilismo nacional e trabalhava no lançamento de um novo Super Vee.

Por Roberto Zullino

 

 

 

Gerry Cunningham é um brasileiro, carioca, que foi sócio minoritário do Donald Pacey na Glaspac, uma das pioneiras em fibra de vidro. Entre suas façanhas, construir os Ford Cobra, dar assistência às equipes de Fórmula 1 quando vinham a Interlagos, pois a Glaspac ficava no bairro de Socorro, perto do autódromo. Qualquer problema iam para a Glapac.

Ele trabalhou antes com o Jim Russel ajudando a fazer os 10 Lotus Fórmula Jr (alguns eram F3) para o filme Grand Prix e ainda testou todos os carros antes de serem entregues ao John Frankenheimer, que dirigiu o filme. E também foi com o Emerson para a Inglaterra e o apresentou para o Denis Rowlands. Há muitos anos, ele mora em Portugal com a esposa, Karen, e já andou 290 mil km com sua BMW GS. Na foto, quem está à esquerda todos conhecem, é o Juan Manuel Fangio.

 

Gerry Cunningham (centro), com a mulher, Karen, e o ex-piloto argentino Juan Manuel Fangio (crédito: arquivo pessoal/Roberto Zullino).

 

 

Nada como um amigo de toda a vida para fazer uma declaração sobre o infeliz passamento do querido Ricardo Divila. A declaração do Gerry, que fala português perfeitamente com sotaque carioca, mas mistura inglês na conversa:

 

“Zullino, que triste notícia.

Me lembro quando ele, recém-formado, bateu na porta da Glaspac.

Trazia debaixo do braço um projeto de um carro de competição feito de balsa.

Era antes da época do Cobra mais depois do Buggy. Como coches de carreira não eram a nossa praia (tínhamos feito as carrocerias dos karts para o Mario; as carrocerias dos FV; a carenagem do “shark nose” que o Landi fez com motor Alfa FNM e no qual o Celso Lara Barberis morreu; a carroceria do VW Bi-motore com propulsão flat 8 made in help (Socorro), de autoria do Brizzi; peças para as carreteiras do Lobão do Canindé; o AC do Anisio; e anos depois peças para vários projetos de nossa rica indústria tupiniquim, como vários Avalones, todos componentes dos 50 exemplares dos Fiats Fittipaldi, carenagem dos F2, Fórmula Brasil etc.; e posteriomente trabalhamos juntos com o Divila e o David Baldwin no Copersucar.

Encaminhei “O Inglês”, “as he was better known later on”, para os nossos vizinhos, os “Irmãos Fittipaldi”. A fábrica onde fabricavam os volantes F1 ficava ao lado, éramos vizinhos de pared. Eles foram felizes e o contrataram. Foi a melhor coisa que fizeram e deu no que deu. Um carro de F1 made in Brasil numa época dominada pelos europeus. Um grande feito e algo do qual nós brasileiros devemos nos orgulhar. Temos de dar valor e reverenciar a memória do “Inglês”, que tem uma rica história no automobilismo mundial!! Uma ‘ figura’’ – “that will be sadly missed”.

Muito triste saber que o “Inglês” recebeu a bandeirada final.

Ele certamente teve um papel importante na época turbulenta, caótica e difícil do rico cenário automobilístico brasileiro. Ele teve que superar obstáculos incríveis, ainda mais com recursos limitados, tanto na parte técnica quanto financeira, para competir com as poderosas equipes europeias. Foi um leão!

Não existem muitas pessoas no mundo inteiro que podem incluir “Designer de F1” em seu currículo.

Depois da F1, ele participou de uma série de famosas equipes e competições internacionais, como em Le Mans.

Ele era uma pessoa muito querida e um dos grandes da história do automobilismo brasileiro.

Fará muita falta!

RIP “Inglês”, Abração, G."

 

Essa é a declaração do Gerry, que conheceu e trabalhou com o Divila desde a juventude. Ninguém melhor do que ele para contar o começo da história. Eu jamais soube que foi o Gerry quem apresentou o Divila para os Fittipaldis, porque o Gerry nunca falou nada, mesmo sendo meu vizinho na Granja Vianna por mais de 20 anos.

 

Ricardo Divila no cockpit do primeiro Copersucar Fittipaldi, ainda em construção, em 1974 (crédito: arquivo pessoal/Ricardo Divila).

 

 

O que eu tenho a dizer do Divila? Eu o conheci há 50 anos, mas nos útimos anos ficamos mais próximos porque ele ajudou na Fórmula Vee a pedido do Wilson. Facilmente, desenhou uma suspensão traseira multilink para uso de câmbio de 5 marchas. Coisa simples e bem feita.

Quem pensa que o Divila era um “petrolhead” se engana, era uma pessoa culta, adorava música clássica, filosofia e tinha um humor excelente, jamais o vi nervoso, mesmo quando as coisas não davam certo.

Depois, desenhou um Super Vee muito simples usando tudo o que sabia, e sabia muito. Ele parecia um mágico, sentava no computador e em horas já tinha o projeto pronto e desenhado. Nada de fibra de carbono. Ele deixou claro em artigos na mais respeitada revista de automobilismo, a Racecar Engineering, onde era colunista, que iria fazer um carro tubular, mas com coisas inéditas de segurança para velocidades maiores. Projetou uma estrutura tubular leve com chapas duplas de aço soldadas e poliuretano no meio. Chegou num peso de projeto de 380 kg. A comunidade dos engenheiros de automobilismo gostou do projeto e até os chineses se interessaram.

O projeto do FD01 na Fórmula 1 é a melhor prova que o Divila pensava “fora da caixa”. Não deu certo na época, mas todos copiaram depois. Aqui, tirando a Fórmula Vee para quem o Super Vee foi projetado, sequer tomaram conhecimento do projeto, apesar da Fórmula Vee ter divulgado as reportagens da Racecar Engineering.

 

Ricardo Divila observa o primeiro Copersucar-Fittipaldi, em teste antes da abertura da temporada 1975 da Fórmula 1 (crédito: Claudio Laranjeira).

 

 

Pessoa extremamente fácil de lidar e não tinha segredos, muito ao contrário, adorava ensinar e passava muito de seu tempo ensinando jovens em escolas na Inglaterra, França e Alemanha. Cobrava uma merreca das escolas que o contratava e muitas vezes fazia de graça só pelo prazer de ensinar. Tivemos discussões pelo Skype sobre isso porque éramos diferentes em relação a dinheiro. Fui professor de engenharia por cinco anos, mas o dia que achei que não me pagavam bastante, virei as costas e fui embora. O Ricardo escolheu fazer isso porque ganhava bem nas várias equipes que trabalhou e morava em Magny Cours em um belo sítio afastado, abarrotado de livros e discos. De lá estava no mundo pelo Skype.

Era um cara “hands on”, foi várias vezes em ferros velhos olhar câmbios, mangas, eixos e outros componentes que usou no desenho da suspensão multilink dos Fórmula Vee e que permitiu usar o câmbio de 5 marchas e homocinéticas. Uma solução simples, barata e eficiente. Media tudo e depois desenhava no computador.

 

Ricardo Divila desenha um projeto da equipe Copersucar-Fitipaldi, em 1975 (crédito: arquivo pessoal/Ricardo Divila).

 

 

Era um dos consultores da FIA e resolveu o problema dos carros da WEC decolarem ao virarem ao contrário quando o difusor se inverte. Solução simples usando imãs e sensores.

Acho que poderia escrever laudas e laudas sobre o que conversamos, mas não tenho ânimo nesta hora, pois levei um baque enorme ao perder um amigo e meu guia no trabalho de projeto. Ao longo do tempo os “causos” acabam aparecendo.

O que vou fazer agora é organizar o projeto do Super Vee que foi sua última obra e construir o carro. É o mínimo.

 

 

 

 

Ricardo Divila, em Interlagos (crédito: Fernando Santos/Divulgação FVee).

 

 

Ricardo Divila e Wilsinho Fittipaldi, em Interlagos, durante etapa do Campeonato Paulista de Fórmula Vee, em 2017 (crédito: Fernando Santos/Divulgação FVee).

 

 

Wilson Fittipaldi, Flávio Menzes (diretor da FVee) e Ricardo Divila, em Interlagos, 2017 (crédito: Fernando Santos/Divulgação FVee).

 

 

 

 

 

 


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